quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

O Rosto é dos Outros

Lição básica, em Espiritismo, ensina que, num planeta de expiação e provas como a Terra, escola das primeiras letras no aprendizado das Leis Divinas, a grande alavanca evolutiva, que nos desloca do imobilismo egoístico para a dinâmica da fraternidade, é o sofrimento.
Assim, somente por exceção encontraremos alguém cuja existência flui tranquila, alheio às dores do Mundo, algo tão inusitado, tão estranho, que é como se não estivesse vivo, conforme exprime admiravelmente Francisco Otaviano:
Quem passou pela vida em branca nuvem
E em plácido repouso adormeceu;
Quem não sentiu o frio da desgraça,
Quem passou pela vida e não sofreu;
Foi espectro de homem, não foi homem,
Passou pela vida, não viveu.
O que nos leva a supor que há pessoas sem problemas, cuja existência semelha-se a um mar de rosas, é o fato de carregarem o fardo de suas dores sem lamentações nem desânimo, demonstrando muito valor e determinação.
Ensina a sabedoria popular que o coração é nosso, mas o rosto é dos outros. Imperioso conservar o bom ânimo, a disposição de sorrir, a expressão suavizada por irrestrita confiança em Deus, porquanto ninguém se edifica nem se anima diante de um cenho carregado, como outdoor de mau gosto fazendo propaganda da infelicidade. Segundo a expressão bem-humorada de uma freira, a pessoa amargurada é uma obra prima do demônio: ninguém se sente feliz a seu lado.
Curiosa pesquisa demonstrou que a expressão facial, que geralmente reflete nossas emoções, pode deixar de ser efeito para transformar-se em causa. Voluntários que, a título de experiência, conservaram expressão som¬bria, em pouco tempo sentiram tristeza e mau humor.
Há quem alegue dificuldade em manter o sorriso, reclamando que seus males excedem o razoável. Evidentemente, sempre nos parecerá mais fácil enfrentar a adversidade sendo rico com saúde a ser pobre e tuberculoso...
Consideremos, entretanto, que as dores do Mundo não são distribuídas aleatoriamente, como uma loteria de desgraças, com prêmios maiores ou menores. O montante dos problemas cármicos que enfrentamos diz respeito não apenas às nossas necessidades evolutivas, mas, também, à nossa capacidade de solucioná-los. Inconcebível que Deus nos imponha situações insuportáveis, uma cruz que não possamos carregar.
Um ótimo recurso para desanuviar a mente e suavizar o rosto, até mesmo para evitar rugas precoces e per¬turbadoras tristezas, é a conversa com o espelho. Parecer-nos-á risível a carantonha amargurada, se nos dispusermos a um questionamento franco e severo com a imagem refletida, como quem passa um pito em si mesmo:
─ Coitadinho! Tão infeliz! Estão judiando do filhinho da mamãe! Qual o quê! Você devia ter vergonha na cara! Há milhões de pessoas em situação pior e nem por isso estão brigadas com a Humanidade. Tome jeito, rapaz! Pare com isso! Não contamine o ambiente com suas indébitas amarguras! Experimente sorrir!
Um homem de ânimo forte, desses que enfrentam as situações mais difíceis fazendo blague, teve grave problema circulatório que culminou com a amputação de uma perna. Algum tempo depois se manifestou o mesmo mal na outra perna, que foi também amputada. Após a segunda cirurgia, tão logo despertou da anestesia, o médico perguntou-lhe:
─ Então, como se sente?
─ Estou bem, Doutor, mas há um probleminha que será difícil solucionar.
─ Fale. Farei o que for possível.
─ Creio que nem o senhor poderá me ajudar. É que sem as pernas não sei mais em que pé está à situação...
Quem consegue rir dos próprios males jamais será infeliz.

Richard Simonetti
richardsimonetti@uol.com.br

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