terça-feira, 28 de maio de 2013

O descuido impensado

No orfanato em que trabalhava, Irmã Clara era o ídolo de toda gente pelas virtudes que se adornavam o caráter.Era meiga, devotada, diligente.
Daquela boca educada não saíam más palavras.
Se alguém comentava faltas alheias, vinha solícita, aconselhando:
— Tenhamos compaixão... Inclinava a conversa em favor da benevolência e da paz.
Insuflava em quantos a ouviam o bom ânimo e o amor ao dever.
Além do mais, estimulava, acima de tudo, em todos os circunstantes a boa vontade de trabalhar e servir para o bem.
— Irmã Clara — dizia uma educadora —, tenho necessidade do vestido para o sábado próximo.
Ela, que era a costureira dedicada de todos, respondia, contente:
— Trabalharemos até mais tarde. A peça ficará pronta.
— Irmã — intervinha uma das criadas —, e o avental?
— Amanhã será entregue — dizia Clara, sorrindo.
Em todas as atividades, mostrava-se a desvelada criatura qual anjo de bondade e paciência.
Invariavelmente rodeada de novelos de linha, respirava entre a agulha e a máquina de costurar.
Nas horas da prece, demorava-se longamente contrita na oração.
Com a passagem do tempo, tornava-se cada vez mais respeitada. Seus pareceres eram procurados com interesses.
Transformara-se em admirável autoridade da vida cristã.
Em verdade, porém, fazia por merecer as considerações de que era
cercada.Amparava sem alarde.
Auxiliava sem preocupação de recompensa.
Sabia ser bondosa, sem humilhar a ninguém com demonstrações de
superioridade.
Rolaram os anos, como sempre, e chegou o dia em que a morte a conduziu para a vida espiritual.
Na Terra, o corpo da inesquecível benfeitora foi rodeado de flores e
bênçãos, homenagens e cânticos e sua alma subiu, gloriosamente, para o Céu.
Um anjo recebeu-a, carinhoso e alegre, à entrada.
Cumprimentou-a. Reportou-se aos bens que ela espalhara, todavia, sob impressão de assombro,Irmã Clara ouviu-o informar:
—Lastimo não possa demorar-se conosco senão por três semanas.
—Oh! porquê? — interrogou a valorosa missionária.
—Será compelida a voltar, tomando novo corpo de carne no mundo
esclareceu o mensageiro.
—Como assim?
O anjo fitou-a, bondoso, e respondeu:
—A Irmã foi extremamente virtuosa; entretanto, na posição espiritual em que se encontrava não poderia cometer tão grande descuido.Desperdiçou uma enormidade de fios de linha impensadamente. Os novelos que perdeu, por 28 
alhear-se à noção de aproveitamento, davam para costurar alguns milhares de
vestidos para crianças desamparadas.
—Oh! Oh! Deus me perdoe! — exclamou a santa desencarnada — e como resgatarei a dívida?
O anjo abraçou-a, carinhoso, e reconfortou-a dizendo:
— Não tema. Todos nós a ajudaremos, mas a querida irmã recomeçará sua tarefa no mundo plantando algodão.

ALVORADA CRISTÃ- Chico Xavier-Néio Lúcio

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