segunda-feira, 17 de junho de 2013

O Castigo

Por Sérgio Ribeiro

Os Espíritos maus, egoístas e inflexíveis, logo após a morte são entregues a uma dúvida cruel sobre o seu destino presente e futuro; inicialmente olham em torno de si e, porque não vêem nenhum assunto sobre o qual possam exercer a sua influência má, o desespero apodera-se deles, uma vez que o isolamento e a inação são intoleráveis para os Espíritos maus; não levantam o olhar para os lugares habitados pelos Espíritos puros; consideram o que os cerca e logo, sensibilizados pelo abatimento dos Espíritos fracos e punidos, lançam-se a eles como a uma presa, armando-se com a lembrança de suas faltas passadas, incessantemente postas em ação por meio de gestos irrisórios. Não lhes bastando esta zombaria, lançam-se sobre a Terra como abutres esfaimados; procuram entre os homens a alma que dará mais fácil acesso às suas tentações; delas se apoderam, exaltam-lhe a cobiça, tentam extinguir a sua fé em Deus e, finalmente, quando donos de uma consciência vêem a presa dominada, espalham o fatal contágio sobre tudo que se aproximar de sua vítima.
O Espírito mau que dá vazão à sua raiva é quase feliz; apenas sofre nos momentos em que não age e também naqueles em que o bem triunfa sobre o mal.
Entretanto, passam os séculos; o Espírito mau sente-se de súbito invadido pelas trevas. Aperta-se o seu círculo de ação, e sua consciência, até então muda, faz-lhe sentir as pontas aceradas do arrependimento. Inativo, arrastado pelo turbilhão, vaga, sentindo, como diz a Escritura, o pêlo de sua carne se eriçar de pavor; em breve um grande vazio se faz nele e ao seu redor; chegado o momento, deve expiar; a reencarnação, ameaçadora, lá está; ele vê, como numa miragem, as provas terríveis que o aguardam; gostaria de recuar, mas avança e, precipitado no abismo escancarado da vida, rola apavorado até que o véu da ignorância lhe cai sobre os olhos. Vive, age, é ainda culpado; sente em si uma espécie de lembrança inquietante, de pressentimentos que o fazem tremer, mas não o levam a recuar no caminho do mal. Esgotado de forças e de crimes, vai morrer. Estendido sobre o catre ou sobre o leito – não importa – o homem culpado sente, sob aparente imobilidade, mover-se e viver um mundo de sensações esquecidas!
Debaixo das pálpebras fechadas vê surgir um clarão e ouve sons estranhos; sua alma, que vai deixar o corpo, agita-se impaciente, enquanto suas mãos crispadas procuram agarrar-se aos lençóis; gostaria de falar, de gritar aos que o cercam: Segurem-me! vejo o castigo! Não pode; a morte se fixa sobre os lábios descorados e os assistentes dizem: Ei-lo em paz!
Entretanto, ele ouve tudo; flutua em redor do corpo, que não desejaria abandonar; uma força secreta o atrai: vê, reconhece o que já viu. Desvairado, lança-se no espaço, onde quer esconder-se. Não há mais retiro! Não há mais repouso! Outros Espíritos lhe devolvem o mal que ele fez e, castigado, ridicularizado, confuso por sua vez, erra e errará até que o divino clarão penetre a sua resistência e o esclareça, para lhe mostrar o Deus vingador, o Deus triunfante de todo o mal, que ele só poderá apaziguar à força de gemidos e expiações.

Georges



(Médium – Sra. Costel)
Revista Espírita – Outubro de 1860

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