Ouvistes o que foi dito aos antigos: – Quem abandonar sua mulher, dê-lhe carta de divórcio.
Eu, porém, vos digo que quem repudiar sua mulher, a não ser por causa de infidelidade, a torna adúltera; e qualquer que casar com a repudiada comete adultério.
(Mateus, 5:31 e 32.)
Nos primórdios do Judaísmo os vínculos matrimoniais eram bastante frágeis. Se o homem chegasse à conclusão de que sua esposa não lhe convinha, até pelo fato de cometer uma falha no preparo da comida, bastava dar-lhe carta de divórcio, uma espécie de demissão ou rescisão do contrato matrimonial. Isto bem de acordo com a mentalidade da época, situada a mulher em regime de escravidão.
Por incrível que pareça, a carta de divórcio, instituída por Moisés, representava um progresso, pois regulamentava a separação e dava à repudiada o direito de constituir nova família.
No capítulo 19, do Evangelho de Mateus, Jesus diz, categórico, que semelhante instituição deveu-se à dureza do coração humano.
Ao referir-se ao assunto, no Sermão da Montanha, o Mestre explica que o casamento deve ser indissolúvel, admitindo a separação apenas num caso — a infidelidade —, porque esta des-trói as bases fundamentais da união matrimonial: a confiança, a integridade, o respeito, o amor, a dignidade.
A Doutrina Espírita é bastante clara quanto à seriedade do vínculo matrimonial, demonstrando que ele é, geralmente, fruto de planejamento espiritual, e que, ao se ligarem, os cônjuges assumem compromissos muito sérios, não tão somente em relação ao próprio ajuste, mas, particularmente, no concernente aos filhos.
Todo casamento dissolvido representa fracasso dos cônjuges. A separação não faz parte do destino de ambos — é simples¬mente uma alternativa, quando a união entra em crise insuperável. O divórcio, nesta circunstância, defendido por Kardec, em O Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo 22, limita-se tão só a re¬conhecer uma separação já existente. É o mal menor, oferecendo ao casal divorciado a oportunidade de recompor suas vidas e de legalizar sua nova situação perante a sociedade.
Imperioso reconhecer – e nisso reside a seriedade do problema – que a separação representa uma transferência de com¬promissos para o futuro, em regime de débito agravado, sempre que os filhos ou os próprios cônjuges venham a comprometer-se em desajustes e desequilíbrios diretamente relacionados com a desintegração do lar.
Inútil, entretanto, considerar-se os prejuízos advindos da separação, diante daqueles que chegaram a extremos tais de desentendimentos que tornam impossível a vida em comum. Nesta circunstância, nem toda a sabedoria do mundo os convencerá a permanecerem juntos, superando suas desavenças.
Por isso, mais importante do que tentar ajustar peças demasiadamente comprometidas pela ferrugem da discórdia, é cuidar de recursos que garantam a estabilidade matrimonial, a saúde do casamento.
Para tanto, a primeira providência é superar o velho enga¬no cometido pelo homem e pela mulher, que se julgam casados apenas porque assinaram o livro do registro civil, submetendo-se às demais disposições legais.
Socialmente falando o casamento é isso, mas, sob o ponto de vista moral e espiritual, trata-se de um compromisso a ser re¬novado todos os dias. Deve representar o empenho diário de dois seres, de estrutura biológica e psicológica totalmente diferentes, no sentido de se ajustarem. Cérebro e coração, razão e sentimento, força e sensibilidade, o homem e a mulher, realmente, são duas partes que se completam — mas somente com a força do amor. Não o amor paixão, que se esvai após a embriaguez dos primeiros tempos, mas o amor convivência, que se consolida com o perpassar dos anos, desde que sustentado pelos valores da compreensão, do respeito mútuo, da tolerância e da boa vontade.
Emmanuel tem uma imagem muito feliz a respeito do casamento, quando diz que a euforia dos noivos, no grande dia, é semelhante à do estudante que recebe o diploma do curso superior. É o coroamento de seus esforços, de seus anseios...
Mas depois vem o trabalho de cada dia, a dedicação, o es¬forço, o sacrifício, para que seu diploma represente para ele a base de uma vida melhor, econômica e socialmente.
Assim acontece com o casamento. Muita alegria no início, muito empenho depois, porque nenhuma casa será um lar autêntico, oásis de bênçãos e ternura, se não for primeiro uma oficina de boa vontade e de esforço em favor da paz.
Para tanto, lembrando ainda Jesus, é preciso que combatamos a dureza de nossos corações, pois, se bem analisarmos, verificaremos que todo problema de relacionamento humano, em qualquer lugar, principalmente no lar, nasce justamente porque nosso coração se fecha com muita facilidade ante as manifestações do egoísmo, que nos leva a exigir demais dos outros e tão pouco de nós mesmos.
Richard Simonetti
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